Ser mãe é coisa de alma, de disposição e vontade. A gente é mãe quando abraça o "positivo" e chora baixinho se perguntando o que fazer. Não é fácil, tudo muda, mas impossível também não é. Num primeiro momento a gente lamenta e não imagina, mas já se tornou mãe. E é mãe porque lamenta ter que de pausar a vida por alguns meses e adiar conquistas, para gestar; lamenta porque se importa, porque quer oferecer ao filho tudo o que não teve.
Ser mãe é profissão, é vocação e de novo, vontade. Somos mães desde a concepção, até o "não, não nasce ainda não"; somos mães de meninos e meninas, times de futebol e classes inteiras de sala de aula. Não parece, mas quando somos mães, nos tornamos infinitas.
Restou-me escrever sobre ser mãe, porque filho não tive. Nasceu sem vida, segundo o médico. E meu coração foi quase inteiro enterrado junto dele naquele pequeno e mórbido caixão branco, mas alguma parte ficou comigo para sofrer um bocado. Meu pequenino menino que não respirou, mora onde o sol não chega e as flores não desabrocham. A luz do dia, a chuva, o meu toque... Ele nunca verá ou sentirá. "Mortos não sentem", uma prima me disse. Mas ele sentia, eu sei. Coisa de mãe.
Até pouco antes de não-nascer, éramos completos e felizes. Ele me assegurava de que nenhum mal poderia me acometer, me fazia sentir-se intangível; tornei-me uma super-heroína que não voava nem soltava fogo pelos olhos, mas tinha dois corações num só corpo e amor pra mais de dez vidas.
Éramos um time de dois e na nossa torcida, o mundo inteiro vibrava de ternura.
Era tudo por ele e para ele, mas vejam, ele simplesmente não respirou. Senti as dores do mundo, um corte profundo, agulha na veia... E ele não quis viver. (Terá podido, de alguma forma, optar?)
Vi seu rosto uma única vez, depois lhe embrulharam numa manta branca, calçando seus sapatinhos vermelhos que supostamente trariam sorte e levaram embora eternamente. Assim foi para a cova e é assim também que os vermes impiedosos o devoram, como se nada valesse.
Quis gritar, quis arrancar do peito o coração que não quis parar, quis quebrar o vidro da janela que tinha vista para uma linha ferroviária com uma cabeçada. Nada fiz. Faltavam-me as forças, as pernas, o chão e o ar. Faltava ele.
O amor eu tinha, o leite pelos seios jorrando também. Faltava-me o filho. O filho que Sua Santidade que está sempre sentada em seu Trono, arrancou-me. Deus é pai, não mãe. Se fosse, não tiraria de mim a vida que tirou, não me negaria dar a alguém o maior amor do mundo. E: Ele jamais entenderia a minha dor. Ninguém entendeu, ninguém sentiu.
Carreguei no ventre por trinta e nove semanas e quatro dias, a dor por mim ninguém sentiu. Nem a do parto, nem a da perda.
Sempre choro nos dias vinte e três de todos os meses. Choro por não ter comigo a única parte de mim que era perfeita, choro por saber que ele nunca vai voltar e choro por ter certeza de que caso ele chore de fome ou tenha medo do escuro, eu nada poderei fazer. Não ouço, não vejo e nunca mais poderei tocá-lo.
Ser mãe é questão de alma, de simplesmente ser. Algumas amamentam, eu velei o corpo que carreguei por nove meses e esse é o meu jeito de ser mãe também. Seguro-o no que escrevo, embalo-o com minhas palavras sem rima e o alimento com a dor da minha alma que chora de desespero e saudade, dia e noite.
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